Nacionalidade portuguesa para descendentes de judeus sefarditas:
Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto decide pela primeira vez sobre a inconstitucionalidade
Pela primeira vez, em uma decisão judicial, um tribunal português considerou inconstitucionais certas disposições da Lei da Nacionalidade, no que diz respeito à nacionalidade portuguesa por naturalização para descendentes de judeus sefarditas, estabelecendo assim um importante precedente nesta matéria.
Regime da nacionalidade portuguesa para descendentes de judeus
A Lei da Nacionalidade permite que os descendentes de judeus sefarditas requeiram a nacionalidade portuguesa através da demonstração da tradição de pertença a uma comunidade sefardita de origem portuguesa. Contudo, desde setembro de 2022, passou a ser preciso também demonstrar ligações efetivas à comunidade portuguesa.
De acordo com o artigo 24º-A nº3 alínea d) do Decreto-Lei n.º 26/2022, só será possível pedir a nacionalidade se o requerente atender a um de dois critérios abaixo apresentados:
(1) Titularidade, transmitida mortis causa, de direitos reais sobre imóveis situados em Portugal, de outros direitos pessoais de gozo ou de participações sociais em sociedades comerciais ou cooperativas sediadas em Portugal; ou
(2) Deslocações regulares ao longo da vida do requerente a Portugal, quando tais factos demonstram uma ligação efetiva e duradoura a Portugal.
Primeira decisão sobre a inconstitucionalidade das exigências estabelecidas pelo Regulamento da Lei da Nacionalidade
Após diversas críticas direcionadas ao modo como foram feitas essas novas exigências, no passado dia 12 de dezembro de 2023, pela primeira vez, o Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto decidiu no sentido de que o Governo, ao elaborar o Decreto-Lei que regula a Lei da Nacionalidade, ultrapassou os seus poderes, não tendo competência para tal.
Conforme decidido pelo referido tribunal “a matéria da nacionalidade está reservada à lei e, por conseguinte, às opções da Assembleia da República, não se admitindo a introdução de outras fontes diferentes da lei”, sendo assim, “foi introduzido no ordenamento jurídica um requisito da autoria do Governo no uso de um poder regulamentar desrespeitador dos limites da reserva da lei”.
À vista disso, o artigo 24º-A nº3 alínea d) do Decreto-Lei n.º 26/2022 foi considerado inconstitucional pelo tribunal visto que a disciplina da nacionalidade e das suas regras substantivas compete exclusivamente à Assembleia da República. Portanto, as regras substantivas da nacionalidade só podem ser alteradas por meio de uma Lei, e não por meio de um Decreto-Lei.
Qual a importância dessa decisão?
Essa decisão, que diz respeito a um caso específico de um descendente de judeu sefardita português refém do Hamas, poderá ter efeitos para diversos outros casos, visto que configura o primeiro precedente nesta matéria alegando a inconstitucionalidade da norma do Decreto-Lei n.º 26/2022. Sendo a inconstitucionalidade da norma declarada, os interessados em requerer a nacionalidade portuguesa pela via da descendência de judeus sefarditas portuguesas estarão dispensados de comprovar os requisitos do artigo 24º-A nº3 alínea d).